Julia Lemmertz na capa da Revista Camarim de janeiro

domingo, 9 de janeiro de 2011

Na edição deste mês da Revista Camarim a atriz Julia Lemmertz dá uma entrevista falando, entre outras coisas, sobre sua personagem na peça ´Deus da Carnificina´, como foi sua composição e como o espetáculo vem sido recebido pelo público. Aqui está a matéria completa:


Dupla Jornada
Júlia Lemmertz divide o seu tempo entre o teatro e a televisão

"Filho de peixe, peixinho é?" Nem sempre. Mas, no caso de Júlia Lemmertz esse ditado popular é a mais pura verdade. Foi em casa que a estrela teve o seu primeiro contato com a arte cênica. Filha dos saudosos atores Linneu Dias e Lilian Lemmertz, Júlia iniciou sua carreira ainda criança e é hoje uma renomada atriz. Com quase 20 anos de carreira e um currículo extenso, que conta com mais de quinze novelas e diversos filmes, Júlia Lemmertz com certeza escolheu a profissão certa.

No ar com a novela 'Araguaia', de Walter Negrão, a gaúcha interpreta Amélia, uma ex-modelo de origem humilde que mantém um casamento por interesse com o fazendeiro Max, papel interpretado pelo veterano ator Lima Duarte. A trama ganha um novo rumo quando Amélia se envolve afetivamente com o jovem Vitor Vilar, personagem vivido pelo ator Thiago Fragoso. A personagem já é um marco na carreira de Júlia e vem arrancando elogios de público e crítica.

Além da novela, a intérprete está em cartaz no espetáculo 'Deus da Carnificina', de Yasmina Reza, com direção de Emílio de Mello. Nesta deliciosa comédia, Júlia interpreta Annete, uma mãe protetora. Ao lado da atriz Deborah Evelyn e dos atores Orã Figueiredo e Paulo Betti, a atriz entrega-se de corpo e alma a personagem.

Em um dia agitado no Rio de Janeiro, Júlia recebeu nossa equipe em seu camarim. Muito carinhosa e atenciosa com todos ao seu redor, a estrela falou, em entrevista exclusiva, sobre o espetáculo, família, projetos para 2011 e disse ainda a notícia que gostaria de ver estampada na capa de um jornal: "Não há mais a linha de pobreza.", sentenciou a atriz.

A seguir, confira a entrevista dessa atriz dinâmica.

Revista Camarim(RC): Você já conhecia o texto da Yasmina Reza (autora do espetáculo 'Deus da Carnificina') ?

Não. Já tinha ouvido falar desta peça. Muito bem por sinal, mas não tinha lido. Vi outras peças dela que já tinha gostado muito.
RC: O que mais chama a sua atenção no texto da autora?

Ela faz um texto certeiro, sem excessos. Ela dosa um humor crítico, sem "psicologismos", é muito gostoso o jogo que ela propõe aos personagens.
RC: No espetáculo, sua personagem Annete é muito intensa. Você se inspirou em alguém para compor a personagem?

Não exatamente. Ela foi surgindo nos ensaios, a partir de improvisações, das observações do Emílio de Mello [diretor do espetáculo], que me sugeriu ver uns filmes com a Geena Rolands, que faz tão bem uma mulher a beira de um ataque de nervos, ou além dele. Entretanto, Annete foi a mistura de tudo, e tudo estava no texto.
RC: Foi difícil a composição da personagem?

Até achar o caminho, sempre é. A gente nunca sabe nada, até se inspirar e se deixar levar na viagem da construção dela.
RC: Gostou do resultado? Você é muito critica com si mesma?

Gosto muito do resultado do espetáculo como um todo. Acho que cada um de nós é parte importantíssima dele. Não existimos um sem o outro, a gente se ajuda a construir esse resultado. Sou bem severa comigo, mas já sei entrever alguns méritos e relaxar quando as coisas não saem como eu esperava. Sempre tem o outro dia pra acertar, pelo menos no teatro.
RC: Na peça, dois casais começam uma briga por causa dos filhos. Fora de cena você já passou por alguma situação parecida?

Não assim. Coisas mais leves. Brigas de crianças acontecem, nada tão radical, mas tem muitos casos piores do que esse por aí, com certeza.
RC: O espetáculo fala da relação humana. Qual o maior defeito do ser humano? Por quê?

A intolerância. É um dos piores, você não ser capaz de aceitar as diferenças, não admitir que existam outras verdades que não a sua. Tem a ver com tantas guerras e preconceitos. É bem triste.
RC: Como está sendo ser dirigida pelo ótimo Emilio de Mello?

Ele é bárbaro, perspicaz, atento a tudo, um ator também especial, muito certeiro no que queria e dizia, e diz ainda. O bom também é que ele está por perto ainda trabalhando os detalhes. Foi uma descoberta e um prazer trabalhar com alguém que te exige e te dá o seu melhor.
RC: Qual é a sensação em dividir a cena com os atores Paulo Betti, Deborah Evelyn e Orã Figuereido?

São grandes companheiros. Somos os quatro mosqueteiros, um por todos e todos por um! Estamos felizes juntos, fazendo um trabalho bacana e cheios de figurinhas pra trocar. É muito bom estar com atores tão inspirados e dedicados ao teatro, fora que tem muito bom humor e carinho entre a gente.
RC: O espetáculo está sendo muito bem recebido pela critica. Você esperava esse sucesso?

Sabia que era um texto muito festejado por onde passava: Paris, Nova York, Berlim, Barcelona, Argentina. Fora que era um texto disputado aqui. Tivemos sorte de conseguir fazê-lo, e fazer com categoria. Eu acho merecido o reconhecimento de um trabalho tão caprichado por todos: produção, cenografia, luz, direção, elenco, etc.
RC: Como é a Júlia fora do camarim?

Corro para todo lado. Gravando novela, sendo mãe, dona de casa, esposa, e chegando na hora ao teatro!
RC: Ainda bate aquele friozinho na barriga antes de entrar em cena?

Sempre. O jogo nunca está ganho. Tem que jogar, estar pronto para o inesperado. É que nem viver: é melhor estar atento e se entregar, mas sem frio na barriga não tem graça.
RC: Com quem você dividiria o camarim?

Adoro dividir o camarim, sempre tive boas companhias. Ando com saudades da época que dividia com o Alexandre [Borges], meu marido e melhor companheiro, um ator maravilhoso e muito bom de camarim!
RC: Como você descobriu o dom pela arte?

Aos poucos. Fazendo, errando, aprendendo a escutar, estudando, intuindo que esse era o meu caminho.
RC: Qual foi o seu filme inesquecível? Por quê?

'Amarcord' do Fellini. É o filme de uma vida, de uma poesia e loucura...
RC: Qual foi o seu primeiro trabalho profissional como atriz?

Uma novela na Bandeirantes, 'Os Adolescentes' de Ivani Ribeiro.
RC: Você é religiosa?

Sou uma pessoa de fé. Fui batizada na igreja católica, onde casei, mas me interesso por todas as religiões. Acho que está tudo conectado.
RC: Qual o significado do teatro em sua vida?

Significa trabalho e dedicação. Ele transforma pó em ouro, ajuda a gente a ter fôlego e fibra. Faz a gente entender melhor a vida.
RC: Recentemente, foi lançado o livro 'Lilian Lemmertz – Sem rede de proteção', obra que retrata a vida de sua mãe. Como foi relembrar alguns momentos marcantes na vida dessa magnífica atriz?

Foi muito bom poder reunir, num único lugar, grande parte da história dela de atriz. É um documento importante. Tive saudades e gratidão por poder estar em contato tão próximo com as lembranças dela.
RC: A idéia do livro foi sua?

A coleção 'Aplauso' já havia me procurado pra pensar no livro, se eu gostaria de fazer, mas não me senti capaz de fazê-lo sozinha, e um tempo depois o Cleodon [Coelho] me procurou querendo escrever. Conversamos e entreguei a ele todo material que eu tinha e ele foi se aprofundando na pesquisa e falando com as pessoas que trabalharam com ela. Enfim, foi um longo e belo trabalho.
RC: Pensa em transformar a obra em um filme?

Não. Acho que o livro já comunica muito, e ela mesma já fez filmes lindos.
RC: Atuar é...

...viver. A gente atua o tempo todo, de diferentes formas. No caso do ator, vivemos disso.
RC: Na novela 'Araguaia', sua personagem Amélia casou por interesse. Você se inspirou em alguém para compor a personagem?

Não. E nem é tão simples assim, existe um autor que é o Walter Negrão, que justifica essa escolha dela, não só por interesse, por necessidade, por não ter outra saída. Enfim, novelas são histórias que você tem que embarcar, ela própria já te leva.
RC: Como é dividir a cena com o ator Lima Duarte?

Ele é incrível. Cheio de vida e energia. Lima [Duarte] é exigente em cena, com ele e com os que estão ao seu lado.
RC: Na trama, Amélia irá se apaixonar por um homem mais novo. Em sua opinião, a mulher ainda sofre preconceito por ser envolver com o parceiro mais jovem?

Acho uma hipocrisia isso de uma mulher mais velha não poder ter um relacionamento com um homem mais novo. O contrário é perfeitamente possível e ninguém contesta, acha até bacana. É um pensamento machista e eu não dou a mínima pra ele. Cada um que seja feliz do jeito que achar que deve.
RC: Qual é o seu maior sonho?

Ter saúde pra envelhecer bem. Podendo exercer a minha profissão, ver meus filhos terem os seus filhos, ver o mundo mudar e eu junto com ele.
RC: Por falar em mudanças, qual a notícia que você gostaria de ver estampada na capa de um jornal?

"Não há mais a linha de pobreza. Estamos todos acima dela: alimentados, educados e empregados."
RC: Qual o seu maior medo?

Ser dependente fisicamente. Perder a memória, ficar incapaz de viver bem.
RC: Quais são as suas expectativas para 2011?

Espero que essas mudanças que começaram a apontar nesse ano de 2010 se concretizem. Que a gente ande pra frente, apresente soluções, que seja para o bem comum. E que a nossa peça continue em cartaz com sucesso por onde passar!
RC: Deixe um recado para os seus fãs.

Obrigada sempre pelo carinho, muita saúde, amor e paz na vida e consciência. Vamos nos ajudar, ser mais tolerantes e generosos, pode ser tão mais fácil...

Site da Revista: http://www.revistacamarim.com.br/